quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Capítulo I

          Bolas! Bolas! Bolas! Três vezes bolas! O estúpido do despertador tinha "adormecido" outra vez - esquecera-me de lhe dar corda - e eu é que me ia tramar.
          Eram inúmeras as vezes que isto me acontecia, mas o pior eram as reprimendas que apanhava sempre que entrava na sala com a aula prestes a atingir a sua primeira metade. A maior parte dos professores habituara-se já aos meus constantes atrasos e ignorava-os simplesmente, mas havia duas ou três ovelhas que insistiam em tentar fazer de mim o "exemplum" a não seguir. Enquanto isso, o Aper cronometrava ansiosamente todos os meus percalços, na esperança de novos recordes da minha parte.
          Porém, nessa manhã - para meu grande espanto e contentamento - encontrei a universidade completamente invadida pela polícia e, assim, ninguém notou este novo atraso.
          No meio da confusão, consegui encontrar o Bajus e assim fiquei a saber o motivo de semelhante alvoroço: tinham raptado o Doutor Custódio, um santo professor - tão santo que, no final de cada ano, era sempre chamado ao Conselho Científico por não ter chumbado nenhum aluno.
          Aquela notícia deixou-me de rastos, tão grande era a admiração que nutria por tão nobre personagem. Deste modo, após ter bebido umas "bijecas" para me recompor do choque, resolvi-me a tentar descobrir quem o teria raptado, no que fui inteiramente apoiado por todos os meus colegas.
          Pois... as intenções eram boas; o diabo era saber por onde havia de começar as minhas investigações.
          Estava eu prestes a desistir dos meus intentos, mesmo antes de começar, quando me lembrei que o Asquiltes tinha um tio que era polícia.
          Procurei-o imediatamente por todo o lado, mas parecia que também tinha sido raptado, pois ninguém o vira ainda, embora eu tivesse visto o seu "tanque" estacionado lá fora.
          Foi então que o Fidalgo Brancuti me veio avisar que o Asquiltes estava na casa de banho a vomitar; com efeito, o danado ainda não se tinha recomposto da sua última bebedeira, que datava já de há quatro dias.
          Enfim, depois de muitos cafés que lhe enfiámos no bandulho, lá conseguimos que o rapaz fosse procurar o tio para saber algo em relação ao rapto do nosso amado professor. Pelo sim pelo não, acompanhou-o o Excrescência Estatal para evitar que o colega Asquiltes se esquecesse do que ia fazer e abancasse na primeira tasca que encontrasse. Enquanto isso, eu tentava colher informações junto da polícia que inundava a minha adorada universidade. Porém, todas as tentativas foram infrutíferas e nada consegui.
          Mas o Bajulador também não tinha ficado parado e, após bajular este e aquele, conseguiu falar com o chefe do batalhão que tinha sido destacado para se ocupar do caso. E estava eu a tentar apalpar o traseiro à filha da Dr.ª Luísa, quando ele chegou junto de mim todo ofegante e sorridente. Apeteceu-me dar-lhe um violento murro no focinho, pois, quando me tocou no ombro, apanhei um susto do caraças, pensando que era a mãe da miúda.
          - Consegui! Consegui! - exclamava ele, exultando de alegria.
          - Conseguiste... o quê? - perguntei eu, ainda não refeito do susto.
          Olhei então bem para ele e constatei que estava mais vermelho que as minhas cuecas.
          - Estive a falar com o chefe da polícia...
          - Sim?!?
          - Eles já têm um suspeito!
          - Já? - admirei-me eu. - E então, quem é?
          - O Monsenhor!
          Em resumo, o que se passava era o seguinte: o Dr. Custódio e o Monsenhor tinham frequentes rixas desde que aquele rejeitara o aumento que lhe havia sido concedido. Constou mesmo no meio universitário que o Monsenhor tinha ameaçado de morte o bom professor, caso este persistisse em rejeitar o aumento que lhe tinha sido proposto. Ora, um aluno do curso de Gestão que não gostava do Monsenhor por este ter baixado as propinas 90%, conhecedor do atrito entre ambos, foi contar à polícia o que sabia, deixando o simpático clérigo em maus lençóis.
          Perante semelhante nova, restava-me aguardar o regresso do Asquiltes com mais novidades.

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          O relógio da Sé acabava de bater o meio-dia quando eu, acompanhado do Bajus e do Fidalgo, entrei na esquadra da PSP, de acordo com um chamamento do Asquiltes.
          Fomos encontrá-lo na receção.
          - Então, que descobriste? - principiou o Bajus.
          - Conhecem este gajo? - perguntou uma voz atrás de nós.
          Voltei-me e constatei que se tratava de um agente da esquadra, chamado Alverca.
          - Conhecemos, sim! - respondeu o Fidalgo.
          - Diz que se chama Asquiltes e que veio cá por ordem de um tal Ipas...
          - O Ipas sou eu e é verdade que o mandei à esquadra. Mas onde está o Excrescência Estatal, que tinha vindo contigo?
          - Está no hospital - respondeu o agente.
          Ficámos boquiabertos e o nosso olhar inquisitório recaiu sobre o Asquiltes. Mas foi o agente Alverca quem nos elucidou:
          - O vosso amigo aqui vinha a conduzir bêbedo...
          - Então teve um acidente? - perguntou, ansioso, o Bajulador.
          O agente teve um sorriso irónico.
          - Não exatamente! Quando estacionou, esqueceu-se de travar o carro e, no momento em que o vosso colega ia a sair, o veículo descaiu e bateu-lhe com a porta.
          Alguns minutos depois abandonávamos a esquadra, juntamente com o Asquiltes, embora nos apetecesse deixá-lo preso. O agente também não estava muito disposto a deixá-lo sair, mas, quando soube que era sobrinho de um colega seu, aprestou-se a fazê-lo.
          O Fidalgo ainda se lembrou de fazer uma visita ao Excrescência, mas estava na hora do almoço e, assim, fomos para casa do Bajus, que elegemos como quartel-general das nossas investigações.

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          Já era noite quando deixámos o nosso quartel-general, quatro esponjas bem embebidas em álcool. As investigações e a visita do Excrescência tinham de aguardar para o dia seguinte.

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